quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

74ª Catequese

"Fomos escolhidos para crer. Sabemos muito bem que o gesto com o qual o Pai nos confiou a Cristo, o Batismo, o Sacramento, é um gesto misterioso que realiza a sua força de mudança num nível do qual nossa experiência não pode participar. “Quem nasce da carne é carne; quem nasce do Espírito é espírito”, dizia Jesus a Nicodemos. Por isso, é como o vento, “tu podes ouvir o seu ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai” 6. Você pode julgá-lo pelo efeito, pelos resultados. O fato de termos sido chamados a crer nos obriga em primeiro lugar a ter uma ideia clara daquilo a que somos chamados. Se, no Batismo, a virtude da fé, a energia capaz de crer, nos é dada como potencialidade – não imediatamente visível, sensível, perceptível, mas algo que, na educação ou no desenvolvimento da vida, demonstra a sua presença (“tu podes ouvir o seu ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai”) –; se a escolha, termos sido escolhidos para crer, no Batismo, significa que uma potencialidade nova se posiciona em nossa natureza, em nosso ser, então, à medida que a vida cresce, tornando-se consciente, essa virtude inicial se transforma em conteúdo de gesto experiencial, de gesto consciente, de experiência vivida.
A fé não é um sentimento. A fé não é um estado de espírito. A fé nem mesmo é uma atitude. A fé é uma inteligência. No Batismo, foi inserida em nosso ser uma potencialidade de inteligência nova. Eu me lembro de que quando era jovem, e estava no colegial, fazíamos sempre momentos de adoração no seminário. Uma das ideias, dos pensamentos, que mais me impressionavam era esta: “Eu venho até aqui e, para mim, na hóstia está o mistério da pessoa de Cristo, realmente, Cristo morto e ressuscitado realmente presente. Eu não sei bem o que significam, no fundo, os valores e os significados desta Presença, mas sei que está presente de verdade. Se aparecer aqui um protestante, para ele essa hóstia, na melhor das hipóteses, será um símbolo, um sinal que não contém nada, um pedacinho de pão ázimo”. Então eu ficava impressionado com o fato de ver alguma coisa que outros não podiam ver. Mas que significa esse “ver” (pois eu não via com os olhos a presença de Cristo)? Aí está a importância da palavra que usamos antes: reconhecer, reconhecer uma Presença.
Reconhecer uma Presença. Deveríamos reler, como cheguei a pensar em fazer, o início do Evangelho de São João 7, quando aqueles dois ficam tocados pela expressão profética de João Batista, que estica o braço na direção de Cristo, que estava ali, no meio dos outros. Ele o havia sentido como mais um no meio dos outros. Mas, quando Jesus estava indo embora, João Batista foi como que tomado por um raptus profético e, esticando os braços na direção d’Ele, gritou: “Eis o Cordeiro de Deus!”. E aqueles dois, atentíssimos, impressionados com o gesto de João Batista, puseram-se a seguir Jesus. E Jesus se voltou: “O que buscais?”, “Mestre, onde moras?”, “Vinde ver”. E foram e viram onde morava e ficaram lá o dia todo. “Era por volta das quatro da tarde.”
No dia seguinte, André, que era um dos dois, encontrando seu irmão, Simão, lhe disse: “Encontramos o Messias!”. Que havia acontecido? É que aqueles dois, tendo ido à casa de Jesus, ficaram impressionados com Ele – o Evangelho não especifica nada, como eu já disse tantas vezes aos mais jovens; são anotações que João evangelista escreve depois de velho, e cada frase supõe uma porção de notícias e comentários que ele não faz, como quando a gente escreve num caderninho de notas. Quem pode saber o que Jesus disse? É claro que devem ter perguntado a Ele: “Quem és tu?”, e Ele deve ter respondido: “Eu sou o Messias que está para vir”. E eis que nasceu neles, aconteceu neles, foi dado a eles, aceitaram reconhecer naquele homem que viam com seus olhos algo que não podiam ver com seus olhos: numa realidade, conteúdo da experiência humana, reconheceram a presença de algo maior, do divino – naquele homem que caminhava pelas ruas.
Leiamos um trecho do capítulo 4 do Evangelho de São Lucas: “Jesus foi à cidade de Nazaré, onde se tinha criado. Conforme seu costume, entrou na sinagoga no sábado, e levantou-se para fazer a leitura. Deram-lhe o livro do profeta Isaías. Abrindo o livro, Jesus achou a passagem em que está escrito: ‘O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a Boa Nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar um ano da graça do Senhor’. Depois fechou o livro, entregou-o ao ajudante, e sentou-se. Todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele. Então começou a dizer-lhes: ‘Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir [Eu cumpro justamente essas coisas]’” 8.
Alguns reconheceram nisso o sinal do que Ele dizia ser, reconheceram n’Ele a expressão do mistério de Deus. Outros, por uma série de motivos, o principal deles um apego provinciano a sua cidadezinha, não aceitaram crer, ou seja, não aceitaram reconhecê-Lo..."(Dom Giussani)

Nenhum comentário:

Postar um comentário