sexta-feira, 1 de julho de 2011

CONCELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA E IMPOSIÇÃO DOS PÁLIOS AOS NOVOS ARCEBISPOS METROPOLITANOS NA SOLENIDADE DOS SANTOS PEDRO E PAULO HOMILIA DO PAPA BENTO X



Amados irmãos e irmãs!

«Non iam servos, sed amicos» - «Já não vos chamo servos, mas amigos» (cf. Jo 15, 15). Passados sessenta anos da minha Ordenação Sacerdotal, sinto ainda ressoar no meu íntimo estas palavras de Jesus, que o nosso grande Arcebispo, o Cardeal Faulhaber, com voz um pouco débil já mas firme, nos dirigiu, a nós novos sacerdotes, no final da cerimónia da Ordenação. Segundo o ordenamento litúrgico daquele tempo, esta proclamação significava então a explícita concessão aos novos sacerdotes do mandato de perdoar os pecados. «Já não sois servos, mas amigos»: eu sabia e sentia que esta não era, naquele momento, apenas uma frase «de cerimónia»; e que era mais do que uma mera citação da Sagrada Escritura. Estava certo disto: neste momento, Ele mesmo, o Senhor, di-la a mim de modo muito pessoal. No Baptismo e na Confirmação, Ele já nos atraíra a Si, acolhera-nos na família de Deus. Mas o que estava a acontecer naquele momento, ainda era algo mais. Ele chama-me amigo. Acolhe-me no círculo daqueles que receberam a sua palavra no Cenáculo; no círculo daqueles que Ele conhece de um modo muito particular e que chegam assim a conhecê-Lo de modo particular. Concede-me a faculdade, que quase amedronta, de fazer aquilo que só Ele, o Filho de Deus, pode legitimamente dizer e fazer: Eu te perdoo os teus pecados. Ele quer que eu – por seu mandato – possa pronunciar com o seu «Eu» uma palavra que não é meramente palavra mas acção que produz uma mudança no mais íntimo do ser. Sei que, por detrás de tais palavras, está a sua Paixão por nossa causa e em nosso favor. Sei que o perdão tem o seu preço: na sua Paixão, Ele desceu até ao fundo tenebroso e sórdido do nosso pecado. Desceu até à noite da nossa culpa, e só assim esta pode ser transformada. E, através do mandato de perdoar, Ele permite-me lançar um olhar ao abismo do homem e à grandeza do seu padecer por nós, homens, que me deixa intuir a grandeza do seu amor. Diz-me Ele em confidência: «Já não és servo, mas amigo». Ele confia-me as palavras da Consagração na Eucaristia. Ele considera-me capaz de anunciar a sua Palavra, de explicá-la rectamente e de a levar aos homens de hoje. Ele entrega-Se a mim. «Já não sois servos, mas amigos»: trata-se de uma afirmação que gera uma grande alegria interior mas ao mesmo tempo, na sua grandeza, pode fazer-nos sentir ao longo dos decénios calafrios com todas as experiências da própria fraqueza e da sua bondade inexaurível.

«Já não sois servos, mas amigos»: nesta frase está encerrado o programa inteiro duma vida sacerdotal. O que é verdadeiramente a amizade? Idem velle, idem nolle – querer as mesmas coisas e não querer as mesmas coisas: diziam os antigos. A amizade é uma comunhão do pensar e do querer. O Senhor não se cansa de nos dizer a mesma coisa: «Conheço os meus e os meus conhecem-Me» (cf. Jo 10, 14). O Pastor chama os seus pelo nome (cf. Jo 10, 3). Ele conhece-me por nome. Não sou um ser anónimo qualquer, na infinidade do universo. Conhece-me de modo muito pessoal. E eu? Conheço-O a Ele? A amizade que Ele me dedica pode apenas traduzir-se em que também eu O procure conhecer cada vez melhor; que eu, na Escritura, nos Sacramentos, no encontro da oração, na comunhão dos Santos, nas pessoas que se aproximam de mim mandadas por Ele, procure conhecer sempre mais a Ele próprio. A amizade não é apenas conhecimento; é sobretudo comunhão do querer. Significa que a minha vontade cresce rumo ao «sim» da adesão à d’Ele. De facto, a sua vontade não é uma vontade externa e alheia a mim mesmo, à qual mais ou menos voluntariamente me submeto ou então nem sequer me submeto. Não! Na amizade, a minha vontade, crescendo, une-se à d’Ele: a sua vontade torna-se a minha, e é precisamente assim que me torno de verdade eu mesmo. Além da comunhão de pensamento e de vontade, o Senhor menciona um terceiro e novo elemento: Ele dá a sua vida por nós (cf. Jo 15, 13; 10, 15). Senhor, ajudai-me a conhecer-Vos cada vez melhor! Ajudai-me a identificar-me cada vez mais com a vossa vontade! Ajudai-me a viver a minha existência, não para mim mesmo, mas a vivê-la juntamente convoco para os outros! Ajudai-me a tornar-me sempre mais vosso amigo!

Esta palavra de Jesus sobre a amizade situa-se no contexto do discurso sobre a videira. O Senhor relaciona a imagem da videira com uma tarefa dada aos discípulos: «Eu vos destinei, para que vades e deis fruto e o vosso fruto permaneça» (Jo 15, 16). A primeira tarefa dada aos discípulos, aos amigos, é pôr-se a caminho – destinei, para que vades –, sair de si mesmos e ir ao encontro dos outros. A par desta, podemos ouvir também a frase que o Ressuscitado dirige aos seus e que aparece na conclusão do Evangelho de Mateus: «Ide fazer discípulos de todas as nações…» (cf. Mt 28, 19). O Senhor exorta-nos a superar as fronteiras do ambiente onde vivemos e levar ao mundo dos outros o Evangelho, para que permeie tudo e, assim, o mundo se abra ao Reino de Deus. Isto pode trazer-nos à memória que o próprio Deus saiu de Si, abandonou a sua glória, para vir à nossa procura e trazer-nos a sua luz e o seu amor. Queremos seguir Deus que Se põe a caminho, vencendo a preguiça de permanecer cómodos em nós mesmos, para que Ele mesmo possa entrar no mundo.

Depois da palavra sobre o pôr-se a caminho, Jesus continua: dai fruto, um fruto que permaneça! Que fruto espera Ele de nós? Qual é o fruto que permanece? Sabemos que o fruto da videira são as uvas, com as quais depois se prepara o vinho. Por agora detenhamo-nos sobre esta imagem. Para que as uvas possam amadurecer e tornar-se boas, é preciso o sol mas também a chuva, o dia e a noite. Para que dêem um vinho de qualidade, precisam de ser pisadas, há que aguardar com paciência a fermentação, tem-se de seguir com cuidadosa atenção os processos de maturação. Características do vinho de qualidade são não só a suavidade, mas também a riqueza das tonalidades, o variegado aroma que se desenvolveu nos processos da maturação e da fermentação. E por acaso não constitui já tudo isto uma imagem da vida humana e, de modo muito particular, da nossa vida de sacerdotes? Precisamos do sol e da chuva, da serenidade e da dificuldade, das fases de purificação e de prova mas também dos tempos de caminho radioso com o Evangelho. Num olhar de retrospectiva, podemos agradecer a Deus por ambas as coisas: pelas dificuldades e pelas alegrias, pela horas escuras e pelas horas felizes. Em ambas reconhecemos a presença contínua do seu amor, que incessantemente nos conduz e sustenta.

Agora, porém, devemos interrogar-nos: de que género é o fruto que o Senhor espera de nós? O vinho é imagem do amor: este é o verdadeiro fruto que permanece, aquele que Deus quer de nós. Mas não esqueçamos que, no Antigo Testamento, o vinho que se espera das uvas boas é sobretudo imagem da justiça, que se desenvolve numa vida segundo a lei de Deus. E não digamos que esta é uma visão veterotestamentária, já superada. Não! Isto permanece sempre verdadeiro. O autêntico conteúdo da Lei, a sua summa, é o amor a Deus e ao próximo. Este duplo amor, porém, não é qualquer coisa simplesmente doce; traz consigo o peso da paciência, da humildade, da maturação na educação e assimilação da nossa vontade à vontade de Deus, à vontade de Jesus Cristo, o Amigo. Só deste modo, tornando verdadeiro e recto todo o nosso ser, é que o amor se torna também verdadeiro, só assim é um fruto maduro. A sua exigência intrínseca, ou seja, a fidelidade a Cristo e à sua Igreja, requer sempre que se realize também no sofrimento. É precisamente assim que cresce a verdadeira alegria. No fundo, a essência do amor, do verdadeiro fruto, corresponde à palavra relativa ao pôr-se a caminho, ao ir: amor significa abandonar-se, dar-se; leva consigo o sinal da cruz. Neste contexto, disse uma vez Gregório Magno: Se tendeis para Deus, tende cuidado que não O alcanceis sozinhos (cf. H Ev 1, 6, 6: PL 76, 1097s). Trata-se de uma advertência que nós, sacerdotes, devemos ter intimamente presente cada dia.

Queridos amigos, talvez me tenha demorado demasiado com a recordação interior dos sessenta anos do meu ministério sacerdotal. Agora é tempo de pensar àquilo que é próprio deste momento.

Na solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, antes de mais nada dirijo a minha mais cordial saudação ao Patriarca Ecuménico Bartolomeu I e à Delegação por ele enviada, cuja aprazível visita na ocasião feliz da festa dos Santos Apóstolos Padroeiros de Roma, vivamente agradeço. Saúdo também os Senhores Cardeais, os Irmãos no Episcopado, os Senhores Embaixadores e as autoridades civis, como também os sacerdotes, os colegas da minha Missa Nova, os religiosos e os fiéis leigos. A todos agradeço a presença e a oração.

Aos Arcebispos Metropolitanos nomeados depois da última festa dos grandes Apóstolos, será agora imposto o pálio. Este, que significa? Pode recordar-nos em primeiro lugar o jugo suave de Cristo que nos é colocado aos ombros (cf. Mt 11, 29-30). O jugo de Cristo coincide com a sua amizade. É um jugo de amizade e, consequentemente, um «jugo suave», mas por isso mesmo também um jugo que exige e plasma. É o jugo da sua vontade, que é uma vontade de verdade e de amor. Assim, para nós, é sobretudo o jugo de introduzir outros na amizade com Cristo e de estar à disposição dos outros, de cuidarmos deles como Pastores. E assim chegamos a um novo significado do pálio: este é tecido com a lã de cordeiros, que são benzidos na festa de Santa Inês. Deste modo recorda-nos o Pastor que Se tornou, Ele mesmo, Cordeiro por nosso amor. Recorda-nos Cristo que Se pôs a caminho pelos montes e descampados, aonde o seu cordeiro – a humanidade – se extraviara. Recorda-nos como Ele pôs o cordeiro, ou seja, a humanidade – a mim – aos seus ombros, para me trazer de regresso a casa. E assim nos recorda que, como Pastores ao seu serviço, devemos também nós carregar os outros, pô-los por assim dizer aos nossos ombros e levá-los a Cristo. Recorda-nos que podemos ser Pastores do seu rebanho, que continua sempre a ser d’Ele e não se torna nosso. Por fim, o pálio significa também, de modo muito concreto, a comunhão dos Pastores da Igreja com Pedro e com os seus sucessores: significa que devemos ser Pastores para a unidade e na unidade, e que só na unidade, de que Pedro é símbolo, guiamos verdadeiramente para Cristo.

Sessenta anos de ministério sacerdotal! Queridos amigos, talvez me tenha demorado demais nos pormenores. Mas, nesta hora, senti-me impelido a olhar para aquilo que caracterizou estes decénios. Senti-me impelido a dizer-vos – a todos os presbíteros e Bispos, mas também aos fiéis da Igreja – uma palavra de esperança e encorajamento; uma palavra, amadurecida na experiência, sobre o facto que o Senhor é bom. Mas esta é sobretudo uma hora de gratidão: gratidão ao Senhor pela amizade que me concedeu e que deseja conceder a todos nós. Gratidão às pessoas que me formaram e acompanharam. E, subjacente a tudo isto, a oração para que um dia o Senhor na sua bondade nos acolha e faça contemplar a sua glória. Amen.

SANTA MISSA NA SOLENIDADE DO CORPO E SANGUE DE CRISTO HOMILIA DO PAPA BENTO XVI




Queridos irmãos e irmãs!

A festa do Corpus Christi é inseparável da Quinta-Feira Santa, da Missa in Caena Domini, na qual se celebra solenemente a instituição da Eucaristia. Enquanto na tarde de Quinta-Feira Santa se revive o mistério de Cristo que se oferece a nós no pão partido e no vinho derramado, hoje, na celebração do Corpus Christi, este mesmo mistério é proposto à adoração e à meditação do Povo de Deus, e o Santíssimo Sacramento é levado em procissão pelas estradas das cidades e das aldeias, para manifestar que Cristo ressuscitado caminha no meio de nós e nos guia para o Reino do céu. O que Jesus nos doou na intimidade do Cenáculo, hoje manifestamo-lo abertamente, porque o amor de Cristo não está destinado a alguns, mas a todos. Na Missa in Caena Domini da passada Quinta-Feira Santa ressaltei que na Eucaristia se realiza a transformação dos dons desta terra — o pão e o vinho — finalizada a transformar a nossa vida e a inaugurar assim a transformação do mundo. Esta tarde gostaria de retomar esta perspectiva.

Poder-se-ia dizer que tudo parte do coração de Cristo, que na Útima Ceia, na vigília da sua paixão, agradeceu e louvou a Deus e, deste modo, com o poder do seu amor, transformou o sentido da morte que se estava a aproximar. O facto que o Sacramento do altar tenha assumido o nome «Eucaristia» — «acção de graças» — expressa precisamente isto: que a transformação da substância do pão e do vinho no Corpo e Sangue de Cristo é fruto do dom que Cristo fez de si mesmo, dom de um amor mais forte do que a morte, Amor divino que o fez ressuscitar dos mortos. Eis por que a Eucaristia é alimento de vida eterna, Pão da vida. Do coração de Cristo, da sua «oração eucarística» na vigília da paixão, brota aquele dinamismo que transforma a realidade nas suas dimensões cósmica, humana e histórica. Tudo procede de Deus, da omnipotência do seu Amor Uno e Trino, encarnado em Jesus. Neste amor está imerso o coração de Cristo; por isso Ele sabe agradecer e louvar a Deus também perante a traição e a violência, e desta forma muda as coisas, as pessoas e o mundo.

Esta transformação é possível graças a uma comunhão mais forte que a divisão, a comunhão do próprio Deus. A palavra «comunhão», que usamos também para designar a Eucaristia, resume em si a dimensão vertical e a horizontal do dom de Cristo. É bonita e muito eloquente a expressão «receber a comunhão» referida ao gesto de comer o Pão eucarístico. Com efeito, quando realizamos este gesto, entramos em comunhão com a própria vida de Jesus, no dinamismo desta vida que se doa a nós e por nós. De Deus, através de Jesus, até nós: é uma única comunhão que se transmite na sagrada Eucaristia. Ouvimo-lo há pouco, na segunda Leitura, das palavras do apóstolo Paulo, dirigidas aos cristãos de Corinto: «O cálice da bênção que benzemos não é a comunhão do sangue de Cristo? E o pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo? Uma vez que há um único pão, nós, embora sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos nós comungamos do mesmo pão» (1 Cor 10, 16-17).

Santo Agostinho ajuda-nos a compreender a dinâmica da comunhão eucarística, quando faz referência a uma espécie de visão que teve, na qual Jesus lhe disse: «Eu sou o alimento dos fortes. Cresce e receber-me-ás. Tu não me transformarás em ti, como o alimento do corpo, mas és tu que serás transformado em mim» (Confissões VII, 10, 18). Portanto, enquanto o alimento corporal é assimilado pelo nosso organismo e contribui para o seu sustento, no caso da Eucaristia trata-se de um Pão diferente: não somos nós que o assimilamos, mas é ele que nos assimila a si, de tal modo que nos tornamos conformes com Jesus Cristo, membros do seu corpo, um só com Ele. Esta passagem é decisiva. Com efeito, precisamente porque é Cristo que, na comunhão eucarística, nos transforma em si, neste encontro a nossa individualidade é aberta, libertada do seu egocentrismo e inserida na Pessoa de Jesus, que por sua vez está imersa na comunhão trinitária. Assim a Eucaristia, enquanto nos une a Cristo, abre-nos também aos outros, tornando-nos membros uns dos outros: já não estamos divididos, mas somos um só nele. A comunhão eucarística une-me à pessoa que está ao meu lado e com a qual, talvez, eu nem sequer tenho um bom relacionamento, mas também aos irmãos distantes, em todas as regiões do mundo. Portanto daqui, da Eucaristia, deriva o profundo sentido da presença social da Igreja, como testemunham os grandes santos sociais, que foram sempre grandes almas eucarísticas. Quem reconhece Jesus na Hóstia sagrada, reconhece-O no irmão que sofre, que tem fome e sede, que é estrangeiro, está nu, doente, prisioneiro; e está atento a cada pessoa, empenha-se de modo concreto por todos aqueles que se encontram em necessidade. Portanto, do dom de amor de Cristo provém a nossa especial responsabilidade de cristãos na construção de uma sociedade solidária, justa e fraterna. Especialmente no nosso tempo, em que a globalização nos torna cada vez mais dependentes uns dos outros, o Cristianismo pode e deve fazer com que esta unidade não se edifique sem Deus, ou seja, sem o verdadeiro Amor, o que daria espaço à confusão, ao individualismo e à prepotência de todos contra todos. O Evangelho visa desde sempre a unidade da família humana, uma unidade não imposta do alto, nem por interesses ideológicos ou económicos, mas sim a partir do sentido de responsabilidade recíproca, porque nos reconhecemos membros de um único corpo, do corpo de Cristo, porque aprendemos e continuamos a aprender constantemente do Sacramento do Altar, que a partilha, o amor é o caminho da verdadeira justiça.

Voltemos agora ao gesto de Jesus na Última Ceia. O que aconteceu naquele momento? Quando Ele disse: isto é o meu corpo, que é entregue por vós; isto é o meu sangue, derramado por vós e pela multidão, o que acontece? Neste gesto, Jesus antecipa o acontecimento do Calvário. Por amor, Ele aceita toda a paixão, com a sua dificuldade e a sua violência, até à morte de cruz; aceitando-a deste modo, transforma-a num gesto de doação. Esta é a transformação de que o mundo tem mais necessidade, porque o redime a partir de dentro, abrindo-o às dimensões do Reino dos céus. Mas esta renovação do mundo, Deus quer realizá-la sempre através do mesmo caminho percorrido por Cristo, aliás, o caminho que é Ele mesmo. Não há nada de mágico no Cristianismo. Não existem atalhos, mas tudo passa através da lógica humilde e paciente do grão de trigo que se abre para dar dar vida, a lógica da fé que move as montanhas com a força mansa de Deus. Por isso, Deus quer continuar a renovar a humanidade, a história e o cosmos através desta cadeia de transformações, cujo sacramento é a Eucaristia. Mediante o pão e o vinho consagrados, nos quais estão realmente presentes o seu Corpo e o seu Sangue, Cristo transforma-nos, assimilando-nos a Ele: compromete-nos na sua obra de redenção tornando-nos capazes, pela graça do Espírito Santo, de viver segundo a sua própria lógica de entrega, como grãos de trigo unidos a Ele e nele. É assim que se semeiam e amadurecem nos sulcos da história a unidade e a paz, que constituem o fim para o qual tendemos, segundo o desígnio de Deus.

Sem ilusões, sem utopias ideológicas, nós caminhos pelas veredas do mundo, trazendo dentro de nós o Corpo do Senhor, como a Virgem Maria no mistério da Visitação. Com a humildade de saber que somos simples grãos de trigo, conservemos a certeza firme de que o amor de Deus, encarnado em Cristo, é mais forte que o mal, a violência e a morte. Sabemos que Deus prepara para todos os homens céus novos e uma nova terra, onde reinam a paz e a justiça — e na fé entrevemos o mundo novo, que é a nossa verdadeira pátria. Também esta tarde, enquanto o sol se põe sobre esta nossa amada cidade de Roma, pomo-nos a caminho: connosco está Jesus-Eucaristia, o Ressuscitado, que disse: «Eis que Eu estou convosco todos os dias, até ao fim do mundo» (Mt 28, 20). Obrigado, Senhor Jesus! Obrigado pela vossa fidelidade, que sustém a nossa esperança. Permanecei connosco, porque está a anoitecer. «Bom Pastor, Pão verdadeiro, ó Jesus, tende piedade de nós; alimentai-nos, defendei-nos e conduzi-nos para os bens eternos, na terra dos vivos!». Amém.

Reflexão sobre o Salmo 3, 3-8



"... Porém tu, SENHOR, és um escudo para mim, a minha glória, e o que exalta a minha cabeça.
Com a minha voz clamei ao SENHOR, e ouviu-me desde o seu santo monte.
Eu me deitei e dormi; acordei, porque o SENHOR me sustentou.
Não temerei dez milhares de pessoas que se puseram contra mim e me cercam.
Levanta-te, SENHOR; salva-me, Deus meu; pois feriste a todos os meus inimigos nos queixos; quebraste os dentes aos ímpios.
A salvação vem do SENHOR; sobre o teu povo seja a tua bênção." (Sl 3, 3-8)
No salmo que acabamos de ler vemos a figura de um homem, apenas um homem, frágil na sua humanidade e débil no seu modo de agir, o grande profeta Davi que no sério exercício de sua humanidade pecadora diz com toda voz: " Não sou nada sem Ti, Senhor!" Tu és o meu escudo, minha proteção, és a segurança da minha vida.
O coração do homem tem a cada dia diante de si esse desafio, colocar-se inteiramente nas Mãos do Senhor e deixar-se conduzir por Ele. As dificuldades da caminhada são presença constante no drama de uma humanidade marcada pelo pecado. Os desafios, as lutas, as decepções fazem parte dessa grande aventura de ser gente, e essa aventura ganha sabor e sentido quando o homem reativa a sua memória e recorre ao fundamento de sua própria essência: Deus. Ele é o inicio de tudo, a força motriz que movimenta o mundo, contêm sem ser contido, se humilha sendo grande, ama de verdade sem ser esgotar, pois é Infinito; tudo sabe, tudo vê, tudo sustenta com suas Mãos e mantêm no Ser todas as criaturas. Com um Deus assim, como poderemos temer algo? Como poderemos não confiar? Como não amá-Lo? O salmista prossegue com o seu canto de ação de graças e reconhecimento: "Não temerei dez milhares de pessoas que se puseram contra mim e me cercam.
Levanta-te, SENHOR; salva-me, Deus meu; pois feriste a todos os meus inimigos nos queixos; quebraste os dentes aos ímpios.
A salvação vem do SENHOR; sobre o teu povo seja a tua bênção."
Confia no Senhor, mas pede. Pede o seu favor. Ó Deus força dos que esperam em vós, olhai para a nossa fraqueza e sede compassivo com o vosso povo, perdoai-lhe a culpa e sustentai todos em vossa graça. O grande hino do VENI CREATOR assim se expressa:
"Acendei a luz nos sentidos;
insuflai o amor nos corações,
amparai na constante virtude
a nossa carne enfraquecida."

O Espirito nos ampara na constante virtude e firma a nossa carne enfraquecida. Deus, aquEle que faz tudo aqui e agora, sustenta-nos. Que coisa admirável! Ele se ocupa comigo. Tem tempo para as minhas minúcias. Se importa comigo e deseja viver uma amizade que irrompe as trevas e as barreiras das minhas misérias. Quer amar-me e quer ser amado.
Diante disso o grito que ecoa no mais profundo do ser é aquele do homem tocado pelo Mistério: "Obrigado, Senhor, por seres rocha firme, seguro abrigo, salvação que me devolve a vida!"
Que esse grito vibre em ti, que a constante proteção de Deus se instale na tua vida e que Ele seja o teu único refúgio.
Peçamos a intercessão de Dom Giussani, para que vivendo a beleza de ser cristão, a distração não nos roube de nós mesmos, pelo contrário, a atenção aquilo que nós é dado seja instrumento de intimidade com Cristo!

Sem. Rafael Viana Lima
III Ano de Filosofia do Seminário São José - RJ

Reflexão sobre o Evangelho de Mateus 10, 37-49




"Naquele tempo, disse Jesus a seus apóstolos: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim. Quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim, não é digno de mim.
Quem não toma a sua cruz e não me segue, não é digno de mim.
Quem procura conservar a sua vida, vai perdê-la. E quem perde a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la. " (Mt 10, 37-39)
Querida filha, as palavras que Nosso Senhor dirige a nós neste dia acusa o nosso coraçâo
para a realidade do seguimento a Ele. De fato seguir o Senhor nâo é uma tarefa fácil, ela exige expropriaçâo do ser, renúncia das vontades, e coraçâo aberto para acolher a sua palavra. O desejo de querer seguir não basta, neste caminho empenhativo é a atenção aquilo que nos encoraja a seguir. Atençâo a uma palavra, um gesto, um sinal que aponta para o Destino do homem. Atençâo a uma Presença que tira o nosso comodismo. Atençâo para um Rosto que avança, para o sangue que se derrama, para a salvaçâo que nos é apresentada. Sem essa atençâo o nosso coraçâo desanima, torna-se dependente das pessoas e das coisas. Sem a comoçâo do chamado que Cristo nos faz nâo conseguimos dar um passo sequer rumo a nossa vocaçâo. Se nâo existe coragem no caminho, tudo é vâo. Cristo é vâo, o acontecimento cristâo é apenas um fato qualquer, a salvaçâo torna-se utopia. Se Cristo nâo é Presença real e constante na nossa vida, o barulho e a confusâo do mundo e das pessoas tira o nosso foco e nos obscurece. Vivemos, mas sem o colorido e o sabor do discípulo que deixa tudo para segui-Lo.
No drama humano faz-se mister a urgência de aderir ao designnio salvifico de Deus. sem a adesâo ao Projeto tudo se diminui, a vida fica vazia. Por este motivo as palavras de Cristo nos desafiam:" Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim. Quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim, não é digno de mim." Nao é digno nâo por amar o pai ou a mâe, mas por errar no método. O que significa errar no método? Significa, colocar a esperança da vida no lugar errado. O homem decepciona, ilude, mente, fecha-se na sua mesquinhez: Deus não, Ele é o único que corresponde aos desejos do nosso coração, é o único que pode nos conduzir ao Destino. Ele nos ama e por isso nos chama: ' Vem participar da minha vida!' Só nEle seremos felizes.
Peçamos a Virgem o dom da coragem, ela que não titubiou e acolheu o Deus vivo em sua vida, que ela nos ajude a carregar a nossa cruz de cada dia.

Sem. Rafael Viana Lima
III Ano de Filosofia do Seminário São José - RJ

Reflexão sobre o Salmo 2, 2




«O Senhor disse-Me: “Tu és meu filho, Eu hoje Te gerei”» (SL 2, 2)
Com estas palavras do Salmo segundo, a Igreja dá início à Santa Missa da vigília de Natal, na qual celebramos o nascimento do nosso Redentor Jesus Cristo no estábulo de Belém. Outrora, este Salmo pertencia ao ritual da coroação dos reis de Judá. O povo de Israel, por causa da sua eleição, sentia-se de modo particular filho de Deus, adoptado por Deus. Uma vez que o rei era a personificação daquele povo, a sua entronização era vivida como um acto solene de adopção por parte de Deus, no qual o rei ficava, de certo modo, envolvido no próprio mistério de Deus. Na noite de Belém, estas palavras, que de facto eram mais a expressão duma esperança que realidade presente, ganharam um sentido novo e inesperado. O Menino no presépio é verdadeiramente o Filho de Deus. Deus não é perene solidão, mas um círculo de amor no recíproco dar-se e um dar-se sem cessar. Ele é Pai, Filho e Espírito Santo.
Mais ainda: em Jesus Cristo, o Filho de Deus, o próprio Deus Se fez homem. É a Ele que o Pai diz: «Tu és meu filho». O hoje eterno de Deus desceu ao hoje efémero do mundo e arrasta o nosso hoje passageiro para o hoje perene de Deus. Deus é tão grande que Se pode fazer pequeno. Deus é tão poderoso que Se pode fazer inerme e vir ter connosco como menino indefeso, para que O possamos amar. Deus é tão bom que renuncia ao seu esplendor divino e desce ao estábulo para que O possamos encontrar e, assim, a sua bondade chegue também a nós, se nos comunique e continue a agir por nosso intermédio. O Natal é isto: «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei». Deus tornou-Se um de nós, para que nós pudéssemos viver com Ele, tornarmo-nos semelhantes a Ele. Como próprio sinal, escolheu o Menino no presépio: Deus é assim. Deste modo, aprendemos a conhecê-Lo. E em todo o menino brilha algo da luz daquele hoje, da proximidade de Deus que devemos amar e à qual nos devemos submeter – em todo o menino, mesmo na criança ainda não nascida. " (Papa Bento, Homilia da Missa de Natal, 2005)

Sem. Rafael Viana Lima
III Ano de Filosofia do Seminário São José - RJ

Reflexão sobre o Salmo 1. 1-2





"Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.
Antes tem o seu prazer na lei do SENHOR, e na sua lei medita de dia e de noite." (Sl 1, 1 - 2)
Com estas palavras Davi inaugura uma série de louvores ao Senhor, o Deus altíssimo, Aquele que tem criou tudo e que sustenta com o seu poder toda a criação. Deste modo, Davi quer expressar o verdadeiro programa de vida de quem quer ser bem aventurado, ou seja, feliz. Andar nos caminhos do Senhor e, não se deixar levar pelos conselhos dos injustos, e meditar continuamente a lei de Deus sem se desviar do caminho. Este é o método, a forma e o jeito para quem quer viver uma vida em Deus: não desviar do caminho do bem e meditar em seu coração a vontade de Deus para sua vida. Meditar sim, pois a lei de Deus representa a bússola que nos direciona para a felicidade e o gozo eterno. Sem ela (a lei) o homem se perde, se esconde de Deus e de si mesmo, tentando viver uma humanidade não-verdadeira, buscando em coisas e em realidades miseráveis o seu destino ultimo. A meditação na vontade de Deus é o critério para a abertura do coração tocado pelo Mistério de Deus. O coração que se agarra a vontade de Deus, experimenta o prazer já nessa vida e se coloca na direção do prazer infinito no céu. O Mistério que fez e que continua fazendo todas as coisas, me puxa pelos cabelos e me conduz até a plenitude do meu eu, ou seja, a comunhão com o verdadeiro Tu. Nesse 'Tu' eu encontro o sentido pleno da minha vida, ao passo que, a Sua vontade é também a minha vontade. Se eu descubro isso sou mais homem (mulher) permito que o Mistério norteei a minha vida.
Desejo que essas palavras que nos são oferecidas por Deus, aqui e agora, nos façam perceber a verdadeira beleza que existe em servir e deixar-se conduzir por Ele; se Ele nos toma pela mão e nos olha com a misericórdia que já é peculiar, entenderemos melhor que a Sua vontade é a perfeição que lava os nossos erros e nos transporta para as alegrias definitivas no céu.

Sem. Rafael Viana Lima
III Ano de Filosofia do Seminário São José - RJ

Reflexão sobre a Epístola de São Paulo aos Efésios 1, 20-23



"Ele manifestou sua força em Cristo, quando o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à sua direita nos céus, bem acima de toda a autoridade, poder, potência, soberania, ou qualquer título que se possa mencionar, não somente neste mundo, mas ainda no mundo futuro. Sim, ele pôs tudo sob seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a Cabeça da Igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que possui a plenitude universal." (Ef 1 , 20 - 23)
O Apóstolo Paulo com tais palavras nos leva á contemplação do grande Mistério de Deus. Ele pôs aos pés de Cristo todas as coisas, tudo é dEle e para Ele. Cristo, o Ressuscitado, recebeu de Deus toda a soberania e majestade. O prêmio de seus sofrimentos é a glorificação da parte de Deus Pai. Aquele que sofreu os tormentos da morte e da incompreensão humana, sobe agora aos céus e retorna ao Pai. Deste modo, abre para nós o céu e nos dá a possibilidade de chegar até Deus. Que belo Mistério! O Onipotente, eleva a carne e leva consigo a nossa humanidade. O céu agora nos espera, pois o Senhor glorioso, o Vencedor, o Deus dos deuses, inaugurou uma vida nova para os seus. Aí está o fato da Ascensão: Ele preparou para nós um lugar.
Quando o primeiro astronauta Yuri Gagarin em 1961 realizou o primeiro vôo espacial, retornando à terra fez declaração surpreendente; “Fui até o céu, mas Deus não encontrei”. Ao invés, nós hoje, em todas as igrejas da cristandade, celebramos a festa da Ascensão ao céu do Senhor. O verdadeiro céu não é um espaço onde Deus pode ser contido, o verdadeiro céu é o coração de Deus. Lá conseguimos encontrar paz e sentiremos um gozo sem fim. Perpetuaremos as alegrias terrenas que são passageiras. Diante do Eterno gozaremos de sáude. O Absoluto preparou para nós os manjares celestias que matam a nossa fome. Somente lá o nosso destino encontrará plena realização.
Que o céu não seja uma fantasia pra nós, pelo contrário, seja " a esperança que o seu chamamento vos dá; qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos, e que imenso poder ele exerceu em favor de nós que cremos, de acordo com a sua ação e força onipotente." (Ef, 1, 18 - 19)

Sem. Rafael Viana Lima
III ano de Filosofia, Seminário São José - RJ

Salmo 118, 112



"Acostumei meu coração a obedecer-vos, a obedecer-vos para sempre, até o fim!" (Sl, 118, 112)
O que Davi quer dizer com isso? O que pretende ao dizer essas palavras tão fortes e tão carregadas de profundidade? O que quer explicitar com essa confissão? Sem dúvida a resposta tem origem na sua escolha como rei de Israel. Deus o escolhe dentre todos os seus irmãos, e a escolha de Deus parece até um pouco estranha. Dentre todos os filhos de Jessé, escolhe o mais novo e aparentemente o mais fraco. Davi era pastor, vivia no campo com as ovelhas; cuidava delas e assim vivia. Mais o que dizer para Deus, depois de uma escolha como esta? O que falar para ele? Como escapar de tão árdua missão (ser o rei do povo hebreu)? Com o seu sim Davi prefigura aquilo que durante muito tempo depois escreveria em forma de salmo: " Acostumei meu coração a obedecer-vos,
a obedecer-vos para sempre, até o fim!" No inicio o medo, normal para uma criatura humana. Depois a confiança em Deus. Vence o medo através da confiança em Deus. Eis o método da fé, confiar mesmo sem saber como se dará o propósito de Deus. Acostumar o coração signiifca, colocar Deus no centro da vida (de fato, para um judeu o coração é o local das grandes decisões) e deixar que a Sua vontade prevaleça. Acostumar o coração é essa abertura do ser do homem a Deus, não só neste momento mas: " obedecer-vos para sempre, até o fim!" A escolha de obedecer dever perpassar toda a existência do homem, até o fim de sua vida terrena. A felicidade passar por ai, deixar que o Senhor ocupe um lugar privilegiado na nossa vida deve ser motivo de leticia para nós. Somente com Ele e Nele somos felizes. Se olharmos para a vida de Davi veremos isso. Mesmo nas quedas seu coração se voltava para Deus em prece. Seu coração estava direcionado para o alto (Corações ao alto! diz o sacerdote na Missa) mesmo com a força da gravidade que nos puxa para baixo, a graça de Deus nos puxa para o alto. É lá que deve estar o nosso coração e a nossa alma.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Audiência geral das Quartas - 16 de Fevereiro de 2011


São João da Cruz

Queridos irmãos e irmãs,

Há duas semanas apresentei a figura da grande mística espanhola Teresa de Jesus; hoje gostaria de falar de São João da Cruz, reformador junto com ela da Ordem Carmelita. Nasceu em uma família pobre, tendo ficado órfão de pai ainda jovem. Devido às suas qualidades humanas e resultados no estudo, foi admitido no Colégio dos Jesuítas em Medina do Campo. Terminada a sua formação, decidiu fazer-se Carmelita. Após ter sido ordenado sacerdote, conheceu Santa Teresa, a qual lhe expôs o plano reformador para a sua ordem religiosa, que daria origem aos Carmelitas Descalços. Contudo, a sua adesão à reforma, devido a injustiças e incompreensões, causou-lhe muito sofrimento. Por fim, depois de fazer parte do governo geral da família teresiana, morreu em 1591 [mil quinhentos e noventa e um], dizendo aos seus confrades que recitavam o Ofício Matutino: “Hoje vou cantar o Ofício no céu”. Suas principais obras, nas quais apresenta a sua profunda doutrina mística, são: Subida ao Monte Carmelo; Noite Escura; Cântico Espiritual e Chama viva de Amor.

* * *

Amados peregrinos de língua portuguesa: a todos saúdo cordialmente e recordo, com São João da Cruz, que a santidade não é privilégio de poucos, mas vocação a qual todo cristão é chamado. Por isso, exorto-vos a entrardes de modo sempre mais decidido no caminho de purificação do coração e da vida, para irdes ao encontro de Cristo. Somente nele jaz a verdadeira felicidade. Ide em paz!

Audiência geral das Quartas - 09 de Fevereiro de 2011


Santa Teresa de Ávila [de Jesus]

São Pedro Canísio

Prezados irmãos e irmãs!

Hoje gostaria de vos falar sobre são Pedro Kanis, Canísio na forma latinizada do seu sobrenome, uma figura muito importante no século XVI católico. Nasceu a 8 de Maio de 1521 em Nimega, na Holanda. O seu pai era burgomestre da cidade. Quando era estudante na Universidade de Colónia, frequentou os monges cartuxos de santa Bárbara, um centro propulsor de vida católica, e outros homens piedosos que cultivavam a espiritualidade da chamada devotio moderna. Entrou na Companhia de Jesus a 8 de Maio de 1543 em Mogúncia (Renânia-Palatinado), depois de ter seguido um curso de exercícios espirituais sob a guia do beato Pedro Favre, Petrus Faber, um dos primeiros companheiros de Santo Inácio de Loyola. Ordenado sacerdote em Junho de 1546 em Colónia, já no ano seguinte como teólogo do Bispo de Augsburgo, o cardeal Otto Truchsess von Waldburg, esteve presente no Concílio de Trento, onde colaborou com dois coirmãos, Diogo Laínez e Afonso Salmerón.

Em 1548, santo Inácio fez-lhe completar em Roma a formação espiritual e enviou-o depois ao Colégio de Messina para se exercitar em humildes serviços domésticos. Obteve em Bolonha o doutorado em teologia a 4 de Outubro de 1549 e foi destinado por santo Inácio ao apostolado na Alemanha. Em 2 de Setembro desse ano, visitou o Papa Paulo III em Castel Gandolfo e depois foi à Basílica de São Pedro para rezar. Aí implorou a ajuda dos grandes Santos Apóstolos Pedro e Paulo, que dessem eficácia permanente à Bênção apostólica para o seu grande destino, para a sua nova missão. No seu diário, anotou algumas palavras desta prece. Diz: «Ali senti que uma grande consolação e a presença da graça me eram concedidas por meio de tais intercessores [Pedro e Paulo]. Eles confirmavam a minha missão na Alemanha e pareciam transmitir-me, como apóstolo da Alemanha, o apoio da sua benevolência. Vós sabeis, Senhor, de quantos modos e quantas vezes nesse mesmo dia me confiastes a Alemanha, pela qual depois eu continuaria a ser solícito, pela qual desejaria viver e morrer».

Temos que ter presente o facto de que estamos no tempo da Reforma luterana, no momento em que a fé católica nos países de língua germânica, diante do fascínio da Reforma, parecia definhar. Era quase impossível a tarefa de Canísio, encarregado de revitalizar, de renovar a fé católica nos países germânicos. Só era possível em virtude da oração. Só era possível a partir do centro, ou seja, de uma profunda amizade pessoal com Jesus Cristo; amizade com Cristo no seu Corpo, a Igreja, que deve nutrir-se da Eucaristia, sua presença real.

Continuando a missão recebida de Inácio e do Papa Paulo III, Canísio partiu para a Alemanha e sobretudo para o Ducado da Baviera, que por vários anos foi o lugar do seu ministério. Como decano, reitor e vice-chanceler da Universidade de Ingolstadt, cuidou da vida académica da Instituição e da reforma religiosa e moral do povo. Em Viena, onde por um breve período foi administrador da Diocese, desempenhou o ministério pastoral nos hospitais e nas prisões, tanto na cidade como no campo, e preparou a publicação do seu Catecismo. Em 1556 fundou o Colégio de Praga e, até 1569, foi o primeiro superior da província jesuíta da Alemanha superior.

Nesse ofício, criou nos países germânicos uma densa rede de comunidades da sua Ordem, especialmente de colégios, que foram pontos de partida para a reforma católica, para a renovação da fé católica. Nessa época, participou também no diálogo de Worms com os dirigentes protestantes, entre os quais Filipe Melantone (1557); desempenhou a função de Núncio pontifício na Polónia (1558); participou nas duas Dietas de Augsburgo (1559 e 1565); acompanhou o Cardeal Estanislau Hozjusz, legado do Papa Pio IV junto do Imperador Ferdinando (1560); interveio na Sessão final do Concílio de Trento, onde falou sobre a questão da Comunhão sob as duas espécies e da Lista dos livros proibidos (1562).

Em 1580 retirou-se em Friburgo, na Suíça, dedicando-se inteiramente à pregação e à composição das suas obras, e ali faleceu em 21 de Dezembro de 1597. Beatificado pelo beato Pio IX em 1864, foi proclamado segundo Apóstolo da Alemanha pelo Papa Leão XIII em 1897, e pelo Papa Pio XI canonizado e proclamado Doutor da Igreja em 1925.

São Pedro Canísio transcorreu boa parte da sua vida em contacto com as pessoas socialmente mais importantes da sua época e exerceu uma influência especial com os seus escritos. Foi editor das obras completas de são Cirilo de Alexandria e de são Leão Magno, das Cartas de são Jerónimo e das Orações de são Nicolau de Flüe. Publicou livros de devoção em várias línguas, biografias de alguns santos suíços e muitos textos de homilética. Mas os seus escritos mais divulgados foram os três Catecismos, compostos de 1555 a 1558. O primeiro Catecismo destinava-se aos estudantes capazes de entender noções elementares de teologia; o segundo, aos jovens do povo para uma primeira instrução religiosa; o terceiro, aos jovens com uma formação escolar a nível de escolas secundárias e superiores. A doutrina católica era exposta com perguntas e respostas, brevemente, em termos bíblicos, com muita clareza e sem comentários polémicos. Só durante a sua vida houve 200 edições deste Catecismo! E sucederam-se centenas de edições até ao século XX. Assim na Alemanha, ainda na geração do meu pai, as pessoas chamavam o Catecismo simplesmente o Canísio: foi deveras o Catequista da Alemanha, formou a fé de pessoas durante séculos.

Eis uma características de são Pedro Canísio: saber compor harmoniosamente a fidelidade aos princípios dogmáticos com o devido respeito por cada pessoa. São Canísio distinguiu entre a apostasia consciente, culpável, da fé, da perda da fé inculpável, nessas circunstâncias. E declarou, em relação a Roma, que a maior parte dos alemães que tinham passado para o Protestantismo não tinha culpa. Num momento histórico de fortes contrastes confessionais, evitava — é algo extraordinário — a aspereza e a retórica da ira — algo raro, como disse nessa época, nos debates entre os cristãos — e visava somente à apresentação das raízes espirituais e à revitalização da fé na Igreja. Para isto serviu o conhecimento vasto e incisivo que ele tinha da Sagrada Escritura e dos Padres da Igreja: o mesmo conhecimento que sustentou a sua relação pessoal com Deus e a espiritualidade austera que lhe derivava da devotio moderna e da mística renana.

É característica para a espiritualidade de são Canísio uma profunda amizade pessoal com Jesus. Por exemplo, a 4 de Setembro de 1549 escreve no seu diário, falando com o Senhor: «No final Vós, como se me abrisses o coração do Sacratíssimo Corpo, que me parecia ver diante de mim, ordenastes-me para que bebesse daquela nascente, convidando-me por assim dizer a haurir as águas da minha salvação das vossas fontes, ó meu Salvador». E depois, vê que o Salvador lhe oferece um indumento com três partes que se chamam paz, amor e perseverança. E com este indumento composto de paz, amor e perseverança, Canísio desempenhou a sua obra de renovação do catolicismo. Esta sua amizade com Jesus — que é o centro da sua personalidade — alimentada pelo amor à Bíblia, pelo amor ao Sacramento, pelo amor aos Padres, esta amizade estava claramente unida à consciência de ser continuador da missão dos Apóstolos na Igreja. E isto recorda-nos que todo o evangelizador autêntico é sempre um instrumento unido, e por isso mesmo fecundo, com Jesus e com a sua Igreja.

Na amizade com Jesus, são Pedro Canísio formou-se no ambiente espiritual da Cartuxa de Colónia, onde vivera em íntimo contacto com dois místicos cartuxos: João Lansperger, latinizado em Lanspergius, e Nicolau van Hesche, latinizado em Eschius. Sucessivamente, aprofundou a experiência daquela amizade, familiaritas stupenda nimis, com a contemplação dos mistérios da vida de Jesus, que ocupam uma boa parte nos Exercícios espirituais de santo Inácio. A sua intensa devoção ao Coração do Senhor, que culminou na consagração ao ministério apostólico na Basílica Vaticana, encontra aqui o seu fundamento.

Na espiritualidade cristocêntrica de são Pedro Canísio arraiga-se uma profunda convicção: não há alma solícita da própria perfeição que não pratique todos os dias a oração, prece mental, meio comum que permite ao discípulo de Jesus viver a intimidade com o Mestre divino. Por isso, nos escritos destinados à educação espiritual do povo, o nosso santo insiste sobre a importância da Liturgia com os seus comentários aos Evangelhos, às festas, ao rito da Santa Missa e dos outros Sacramentos, mas ao mesmo tempo preocupa-se em mostrar aos fiéis a necessidade e a beleza que a oração pessoal diária acompanhe e impregne a participação no culto público da Igreja.

Trata-se de uma exortação e de um método que conservam intacto o seu valor, especialmente depois que foram repropostos de modo autorizado pelo Concílio Vaticano II, na Constituição Sacrosanctum concilium: a vida cristã não cresce, se não for alimentada pela participação na Liturgia, de modo particular na Santa Missa dominical, e pela oração individual quotidiana, pelo contacto pessoal com Deus. No meio das mil actividades e dos múltiplos estímulos que nos circundam, é preciso encontrar todos os dias momentos de recolhimento diante do Senhor, para O ouvir e falar com Ele.

Ao mesmo tempo, é sempre actual e de valor permanente o exemplo que são Pedro Canísio nos deixou, não somente nas suas obras, mas sobretudo com a sua vida. Ele ensina com clareza que o ministério apostólico só é incisivo e produz frutos de salvação nos corações, se o pregador for testemunha pessoal de Jesus e souber ser instrumento à sua disposição, unido intimamente a Ele pela fé no seu Evangelho e na sua Igreja, por uma vida moralmente coerente e por uma prece incessante como o amor. E isto é válido para cada cristão que quiser viver com empenhamento e fidelidade a sua adesão a Cristo. Obrigado!


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Saudação

Amados peregrinos de língua portuguesa, para todos a minha saudação amiga e encorajadora! Antes de vós, veio peregrino a Roma Pedro Canísio para invocar a intercessão dos Apóstolos São Pedro e São Paulo sobre a missão que lhe fora confiada na Alemanha, o seu campo de apostolado mais longo. No seu diário, descreve como aqui sentiu a graça divina que fazia dele um continuador da missão dos Apóstolos. Como ele, todos nós, cristãos, somos enviados a evangelizar, mas para isso precisamos de permanecer unidos com Jesus e com a Igreja. Sobre vós e as vossas famílias desça a minha Bênção.

Audiência geral das Quartas - 02 de Fevereiro de 2011



Santa Teresa de Ávila [de Jesus]

Prezados irmãos e irmãs!

Durante as Catequeses que eu quis dedicar aos Padres da Igreja e a grandes figuras de teólogos e de mulheres da Idade Média tive a oportunidade de meditar também sobre alguns Santos e Santas que foram proclamados Doutores da Igreja pela sua doutrina eminente. Hoje gostaria de começar uma breve série de encontros para completar a apresentação dos Doutores da Igreja. E começo com uma santa que representa um dos vértices da espiritualidade cristã de todos os tempos: santa Teresa de Ávila [de Jesus].

Nasce em Ávila, na Espanha, em 1515, com o nome de Teresa de Ahumada. Na autobiografia ela menciona alguns pormenores da sua infância: o nascimento de «pais virtuosos e tementes a Deus», numa família numerosa, com nove irmãos e três irmãs. Ainda menina, com menos de 9 anos, tem a ocasião de ler as vidas de alguns mártires que lhe inspiram o desejo do martírio, a tal ponto que improvisa uma breve fuga de casa para morrer mártir e subir ao Céu (cf. Vida 1, 4); «Quero ver Deus», diz a pequena aos pais. Alguns anos depois, Teresa falará da suas leituras da infância e afirmará que nelas descobriu a verdade, que resume com dois princípios fundamentais: por um lado, «o facto de que tudo o que pertence ao mundo daqui, passa»; por outro, que só Deus é «para sempre», tema que retorna na celebérrima poesia «Nada te turbe / nada te espante; / tudo passa. Deus não muda; / a paciência obtém tudo; / quem possui Deus / nada lhe falta / só Deus basta!». Tendo ficado órfã de mãe com doze anos, pede à Virgem Santissima que lhe seja mãe (cf. Vida 1, 7).

Se na adolescência a leitura de livros profanos a tinha levado às distracções de uma vida mundana, a experiência como aluna das monjas agostinianas de Santa Maria das Graças de Ávila e a leitura de livros espirituais, sobretudo clássicos de espiritualidade franciscana, ensinam-lhe o recolhimento e a oração. Com vinte anos entra no mosteiro carmelita da Encarnação, ainda em Ávila; na vida religiosa assume o nome de Teresa de Jesus. Três anos depois adoece gravemente, a ponto de ficar 4 dias de coma, aparentemente morta (cf. Vida 5, 9). Até na luta contra as próprias doenças a santa vê o combate contra as fraquezas e as resistências à chamada de Deus: «Eu desejava viver — escreve — porque entendia bem que não estava a viver, mas sim a lutar com uma sombra de morte, e não tinha alguém que me desse vida, e nem eu a podia tomar, e Aquele que ma podia dar tinha razão de não me socorrer, dado que muitas vezes me dirigira para Ele, e eu O tinha abandonado» (Vida 8, 2). Em 1543 perde a proximidade dos familiares: o pai falece e todos os seus irmãos emigram, um após o outro, para a América. Na Quaresma de 1554, com 39 anos, Teresa chega ao ápice da luta contra as próprias debilidades. A descoberta da imagem de «um Cristo muito chagado» marca profundamente a sua vida (cf. Vida 9). A santa, que nesse período encontra profunda consonância com o santo Agostinho das Confissões, assim descreve o dia decisivo da sua experiência mística: «Acontece... que de repente tive a sensação da presença de Deus, que de nenhum modo eu podia duvidar que estava dentro de mim, e que eu estava totalmente absorvida nele» (Vida 10, 1).

Paralelamente ao amadurecimento da sua interioridade, a santa começa a desenvolver de modo concreto o ideal de reforma da Ordem carmelita: em 1562 funda em Ávila, com o apoio do Bispo da cidade, D. Alvaro de Mendoza, o primeiro Carmelo reformado, e pouco depois recebe também a aprovação do Superior-Geral da Ordem, Giovanni Battista Rossi. Nos anos seguintes continua as fundações de novos Carmelos, 17 no total. É fundamental o encontro com são João da Cruz com quem, em 1568, constitui em Duruelo, perto de Ávila, o primeiro convento de Carmelitas descalços. Em 1580 obtém de Roma a erecção a Província autónoma para os seus Carmelos reformados, ponto de partida da Ordem religiosa dos Carmelitas descalços. Teresa termina a sua vida terrena precisamente enquanto está empenhada na tarefa de fundação. Com efeito em 1582, depois de ter constituído o Carmelo de Burgos e enquanto voltava para Ávila, falece na noite de 15 de Outubro em Alba de Tormes, repetindo humildemente duas expressões: «No fim, morro como filha da Igreja» e «Meu Esposo, chegou a hora de nos vermos». Uma existência consumida na Espanha, mas despendida pela Igreja inteira. Beatificata pelo Papa Paulo V em 1614 e canonizada em 1622 por Gregório XV, é proclamada «Doutora da Igreja» pelo Servo de Deus Paulo VI em 1970.

Teresa de Jesus não tinha uma formação académica, mas sempre valorizou os ensinamentos de teólogos, letrados e mestres espirituais. Como escritora, sempre se ateve àquilo que pessoalmente vivera ou vira na experiência do próximo (cf. Prólogo ao Caminho de Perfeição), isto é, a partir da experiência. Teresa consegue manter relações de amizade espiritual com muitos santos, em especial com são João da Cruz. Ao mesmo tempo, alimenta-se com a leitura dos Padres da Igreja, são Jerónimo, são Gregório Magno e santo Agostinho. Entre as suas principais obras deve-se recordar sobretudo a autobiografia, intitulada Livro da vida, ao qual ela chama Livro das Misericórdias do Senhor. Composta no Carmelo de Ávila em 1565, discorre sobre o percurso biográfico e espiritual, escrito como afirma a própria Teresa, para submeter a sua alma ao discernimento do «Mestre dos espirituais», são João de Ávila. A finalidade é evidenciar a presença e a acção de Deus misericordioso na sua vida: por isso, a obra cita com frequência o diálogo de oração com o Senhor. É uma leitura que fascina, porque a santa não só narra, mas mostra que revive a profunda experiência da sua relação com Deus. Em 1566, Teresa escreve o Caminho de Perfeição, por ela chamado Admoestações e conselhos que Teresa dá de Jesus às suas monjas. Destinatárias são as doze noviças do Carmelo de são José em Ávila. Teresa propõe-lhes um intenso programa de vida contemplativa ao serviço da Igreja, em cuja base estão as virtudes evangélicas e a oração. Entre os trechos mais preciosos, o comentário ao Pai-Nosso, modelo de oração. A obra mística mais famosa de santa Teresa é o Castelo interior, escrito em 1577, em plena maturidade. Trata-se de uma releitura do próprio caminho de vida espiritual e, ao mesmo tempo, de uma codificação do possível desenvolvimento da vida cristã rumo à sua plenitude, a santidade, sob a acção do Espírito Santo. Teresa inspira-se na estrutura de um castelo com sete quartos, como imagem da interioridade do homem, introduzindo ao mesmo tempo o símbolo do bicho da seda que renasce como borboleta, para expressar a passagem do natural ao sobrenatural. A santa inspira-se na Sagrada Escritura, em particular no Cântico dos Cânticos, para o símbolo final dos «dois Esposos», que lhe permite descrever no sétimo quarto o ápice da vida cristã nos seus quatro aspectos: trinitário, cristológico, antropológico e eclesial. À sua obra de fundadora dos Carmelos reformados, Teresa dedica o Livro das fundações, escrito de 1573 a 1582, em que fala da vida do grupo religioso nascente. Como na autobiografia, a narração visa frisar sobretudo a acção de Deus na obra de fundação dos novos mosteiros.

Não é fácil resumir em poucas palavras a profunda e minuciosa espiritualidade teresiana. Gostaria de mencionar alguns pontos essenciais. Em primeiro lugar, santa Teresa propõe as virtudes evangélicas como base de toda a vida cristã e humana: em especial, o desapego dos bens, ou pobreza evangélica, e isto diz respeito a todos nós; o amor mútuo como elemento básico da vida comunitária e social; a humildade como amor à verdade; a determinação como fruto da audácia cristã; a esperança teologal, que descreve como sede de água viva. Sem esquecer as virtudes humanas: a afabilidade, veracidade, modéstia, cortesia, alegria e cultura. Em segundo lugar, santa Teresa propõe uma profunda sintonia com as grandes figuras bíblicas e a escuta viva da Palavra de Deus. Ela sente-se em sintonia sobretudo com a esposa do Cântico dos Cânticos e com o apóstolo Paulo, mas também com o Cristo da Paixão e com Jesus Eucarístico.

Depois, a santa realça como a oração é essencial; orar, diz, «significa frequentar com amizade, porque frequentamos face a face Aquele que sabemos que nos ama» (Vida 8, 5). A ideia de santa Teresa coincide com a definição que s. Tomás de Aquino dá da caridade teologal, como «amicitia quaedam hominis ad Deum», um tipo de amizade do homem com Deus, que foi o primeiro a oferecer a sua amizade ao homem; a iniciativa vem de Deus (cf. Summa Theologiae II-II, 23, 1). A oração é vida e desenvolve-se gradualmente com o crescimento da vida cristã: começa com a prece vocal, passa pela interiorização mediante a meditação e o recolhimento, até chegar à união de amor com Cristo e a Santíssima Trindade. Obviamente, não se trata de um desenvolvimento em que subir os degraus mais altos quer dizer deixar o precedente tipo di oração, mas é antes um aprofundar-se gradual da relação com Deus que envolve toda a vida. Mais do que uma pedagogia da oração, a de Teresa é uma verdadeira «mistagogia»: ao leitor das suas obras ensina a rezar, orando ela mesma com ele; com efeito, frequentemente interrompe a narração ou a exposição para irromper em oração.

Outro tema amado pela santa é a centralidade da humanidade de Cristo. Com efeito, para Teresa a vida cristã é relação pessoal com Jesus, que culmina na união com Ele pela graça, amor e imitação. Daqui a importância que ela atribui à meditação da Paixão e à Eucaristia, como presença de Cristo na Igreja, pela vida de cada crente e como centro da liturgia. Santa Teresa vive um amor incondicional à Igreja: manifesta um «sensus Ecclesiae» vivo diante dos episódios de divisão e conflito na Igreja do seu tempo. Reforma a Ordem carmelita com a intenção de melhor servir e defender a «Santa Igreja Católica Romana», disposta a dar a vida por ela (cf. Vida 33, 5).

Um último aspecto essencial da doutrina teresiana, que gostaria de frisar, é a perfeição, como aspiração de toda a vida cristã e sua meta final. A santa tem uma ideia muito clara da «plenitude» de Cristo, revivida pelo cristão. No final do percurso do Castelo interior, no último «quarto», Teresa descreve tal plenitude realizada na morada da Trindade, na união a Cristo através do mistério da sua humanidade.

Caros irmãos e irmãs, santa Teresa de Jesus é verdadeira mestra de vida cristã para os fiéis de todos os tempos. Na nossa sociedade, muitas vezes carente de valores espirituais, santa Teresa ensina-nos a ser testemunhas indefessas de Deus, da sua presença e acção, ensina-nos a sentir realmente esta sede de Deus que existe na profundidade do nosso coração, este desejo de ver Deus, de O procurar, de dialogar com Ele e de ser seu amigo. Esta é a amizade necessária para todos nós e que devemos buscar de novo, dia após dia. O exemplo desta santa, profundamente contemplativa e eficaz nas suas obras, leve-nos também a nós a dedicar cada dia o justo tempo à oração, a esta abertura a Deus, a este caminho para procurar Deus, para O ver, para encontrar a sua amizade e assim a vida verdadeira; porque realmente muitos de nós deveriam dizer: «Não vivo, não vivo realmente, porque não vivo a essência da minha vida». Por isso, o tempo da oração não é perdido, é tempo em que se abre o caminho da vida, para aprender de Deus um amor ardente a Ele, à sua Igreja, e uma caridade concreta para com os nossos irmãos. Obrigado!


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Saudação

Dou as boas vindas a todos os peregrinos de língua portuguesa, presentes nesta Audiência! Que o exemplo e a intercessão de Santa Teresa de Jesus vos ajudem a ser, através da oração e da caridade aos irmãos, testemunhas incansáveis de Deus em uma sociedade carente de valores espirituais. Com estes votos, de bom grado, a todos abençôo.

Audiência geral das Quartas - 26 de Janeiro de 2011



Santa Joana d’Arc

Estimados irmãos e irmãs!

Hoje gostaria de vos falar de Joana d’Arc, uma jovem santa do fim da Idade Média, morta com 19 anos em 1431. Esta santa francesa, citada várias vezes no Catecismo da Igreja Católica, está particularmente próxima de santa Catarina de Sena, padroeira da Itália e da Europa, de quem falei numa catequese recente. Com efeito, são duas jovens do povo, leigas e consagradas na virgindade; duas místicas comprometidas, não no claustro, mas sim no meio das realidades mais dramáticas da Igreja e do mundo da sua época. São, talvez, as figuras mais características daquelas «mulheres fortes» que, no final da Idade Média, propagaram sem medo a grande luz do Evangelho nas complexas vicissitudes da história. Poderíamos compará-las com as santas mulheres que permaneceram no Calvário, perto de Jesus Crucificado e de Maria, sua Mãe, enquanto os Apóstolos fugiram e o próprio Pedro O tinha negado três vezes. Naquele período, a Igreja vivia a profunda crise do grande cisma do Ocidente, que durou quase 40 anos. Quando Catarina de Siena faleceu, em 1380, havia um Papa e um antipapa; quando Joana nasceu, em 1412, havia um Papa e dois antipapas. Juntamente com esta laceração no interior da Igreja havia contínuas guerras fratricidas entre os povos cristãos da Europa, das quais a mais dramática foi a interminável «Guerra dos cem anos» entre a França e a Inglaterra.

Joana d’Arc não sabia ler nem escrever, mas pode ser conhecida no mais profunda da sua alma graças a duas fontes de extraordinário valor histórico: os dois Processos que lhe dizem respeito. O primeiro, o Processo de Condenação (PCon), contém a transcrição dos longos e numerosos interrogatórios de Joana, durante os últimos meses da sua vida (Fevereiro-Maio de 1431), e cita as próprias palavras da santa. O segundo, o Processo de Nulidade da Condenação, ou de «Reabilitação» (PNul), contém as desposições de cerca de 120 testemunhas oculares de todos os períodos da sua vida (cf. Procès de Condamnation de Jeanne d'Arc, 3 vols. e Procès en Nullité de la Condamnation de Jeanne d'Arc, 5 vols., ed. Klincksieck, Paris 1960-1989).

Joana nasce em Domremy, um pequeno povoado situado na fronteira entre a França e a Lorena. Os seus pais são camponeses abastados, conhecidos por todos como cristãos excelentes. Deles recebe uma boa educação religiosa, com uma notável influência da espiritualidade do Nome de Jesus, ensinada por são Bernardino de Sena e propagada na Europa pelos franciscanos. Ao Nome de Jesus é sempre unido o Nome de Maria e assim, por detrás da religiosidade popular, a espiritualidade de Joana é profundamente cristocêntrica e mariana. Desde a infância, ela demonstra uma grande caridade e compaixão pelos mais pobres, pelos doentes e por todos os que sofrem, no contexto dramático da guerra.

Das suas próprias palavras sabemos que a vida religiosa de Joana amadurece como experiência mística a partir da idade de 13 anos (PCon, I, pp. 47-48). Através da «voz» do ancanjo são Miguel, Joana sente-se chamada pelo Senhor a intensificar a sua vida cristã e também a comprometer-se pessoalmente pela libertação do seu povo. A sua resposta imediata, o seu «sim» é o voto de virgindade, com um novo compromisso na vida sacramental e na oração: participação quotidiana na Missa, Confissão e Comunhão frequentes, longos momentos de oração silenciosa diante do Crucifixo ou da imagem de Nossa Senhora. A compaixão e o compromisso da jovem camponesa francesa diante do sofrimento do seu povo tornam-se mais intensos graças à sua relação mística com Deus. Um dos aspectos mais originais da santidade desta jovem é precisamente este vínculo entre experiência mística e missão política. Depois dos anos de vida escondida e de amadurecimento interior segue-se o biénio breve, mas intenso, da sua vida pública: um ano de acção e um ano de paixão.

No início do ano de 1429, Joana começa a sua obra de libertação. Os numerosos testemunhos mostram-nos esta jovem de apenas 17 anos como uma pessoa muito forte e determinada, capaz de convencer homens inseguros e desanimados. Superando todos os obstáculos, encontra o Delfim da França, o futuro Rei Carlos VII, que em Poitiers a submete a um exame da parte de alguns teólogos da Universidade. O seu juízo é positivo: nela não vêem nada de mal, mas só uma boa cristã.

A 22 de Março de 1429, Joana dita uma importante carta ao Rei da Inglaterra e aos seus homens que assediam a cidade de Orléans (Ibid., pp. 221-222). A sua proposta é de verdadeira paz na justiça entre os dois povos cristãos, à luz dos Nomes de Jesus e de Maria, mas é rejeitada, e Joana deve empenhar-se na luta pela libertação da cidade, que tem lugar no dia 8 de Maio. O outro momento culminante da sua obra é a coroação do Rei Carlos VII em Reims, no dia 17 de Julho de 1429. Durante um ano inteiro, Joana vive com os soldados, realizando no meio deles uma verdadeira missão de evangelização. São numerosos os testemunhos relativos à sua bondade, à sua coragem e à sua pureza extraordinária. É chamada por todos e ela mesma define-se «a donzela», ou seja, a virgem.

A paixão de Joana tem início a 23 de Maio de 1430, quando cai prisioneira nas mãos dos seus inimigos. No dia 23 de Dezembro é conduzida à cidade de Rouen. É ali que se realiza o longo e dramático Processo de Condenação, que começa em Fevereiro de 1431 e termina a 30 de Maio, com a fogueira. É um processo grande e solene, presidido por dois juízes eclesiásticos, o bispo Pierre Cauchon e o inquisidor Jean le Maistre, mas na realidade inteiramente orientado por um numeroso grupo de teólogos da célebre Universidade de Paris, que participam no processo como assessores. São eclesiásticos franceses que, tendo feito uma escolha política oposta àquela de Joana, têm a priori um juízo negativo sobre a sua pessoa e a sua missão. Este processo é uma página devastante da história da santidade e também uma página iluminadora sobre o mistério da Igreja que, segundo as palavras do Concílio Vaticano II, é «simultaneamente santa e sempre necessitada de purificação» (LG, 8). É o encontro dramático entre esta santa e os seus juízes, que são eclesiásticos. Joana é acusada e julgada por eles, a ponto de ser condenada como herege e enviada à morte terrível na fogueira. Diversamente dos santos teólogos que tinham iluminado a Universidade de Paris, como são Boaventura, são Tomas de Aquino e o beato beato Duns Scoto, dos quais falei em algumas catequeses, estes juízes são teólogos aos quais faltam a caridade e a humildade de ver nesta jovem a obra de Deus. Vêm à mente as palavra de Jesus, segundo as quais os mistérios de Deus são revelados àqueles que têm o coração das crianças, enquanto permanecem escondidos aos doutos e sábios que não têm humildade (cf. Lc 10, 21). Assim, os juízes de Joana são radicalmente incapazes de a compreender, de ver a beleza da sua alma: não sabiam que condenavam uma santa.

O apelo de Joana ao juízo do Papa, a 24 de Maio, é rejeitado pelo tribunal. Na manhã de 30 de Maio ela recebe pela última vez a sagrada Comunhão no cárcere e é imediatamente conduzida ao suplício na praça do velho mercado. Pede a um dos sacerdotes que conserve diante da fogueira uma cruz de procissão. Assim, morre contemplando Jesus Crucificado e pronunciando várias vezes e em voz alta o Nome de Jesus (PNul, I, p. 457; cf. Catecismo da Igreja Católica, 435). Cerca de 25 anos mais tarde, o Processo de Nulidade, aberto sob a autoridade do Papa Calisto III, conclui-se com uma solene sentença que declara nula a condenação (7 de Julho de 1456; PNul, II, pp. 604-610). Este longo processo, que reuniu as deposições das testemunhas e os juízos de muitos teólogos, todos favoráveis a Joana, evidencia a sua inocência e a sua fidelidade perfeita à Igreja. Joana d’Arc será depois canonizada por Bento XV, em 1920.

Prezados irmãos e irmãs o Nome de Jesus, invocado pela nossa santa até nos últimos instantes da sua vida terrena, era como que o suspiro contínuo da sua alma, como a palpitação do seu coração, o centro de toda a sua vida. O «Mistério da caridade de Joana d’Arc», que tanto tinha fascinado o poeta Charles Péguy, é este amor total por Jesus, e pelo próximo em Jesus e por Jesus. Esta santa tinha compreendido que o Amor abraça toda a realidade de Deus e do homem, do céu e da terra, da Igreja e do mundo. Jesus está sempre em primeiro lugar na sua vida, segundo a sua bonita expressão: «Nosso Senhor, o primeiro a ser servido» (PCon, I, p. 288; cf. Catecismo da Igreja Católica, 223). Amá-lo significa obedecer sempre à sua vontade. Ela afirma com total confiança e abandono: «Entrego-me a Deus meu Criador, amo-O com todo o meu coração» (Ibid., p. 337). Com o voto de virgindade, Joana consagra de modo exclusivo toda a sua pessoa ao único Amor de Jesus: é «a sua promessa feita a nosso Senhor, de conservar bem a sua virgindade de corpo e de alma» (Ibid., pp. 149-150). A virgindade da alma é o estado de graça, valor supremo, para ela mais precioso do que a vida: é um dom de Deus, que deve ser recebido e conservado com humildade e confiança. Um dos textos mais conhecidos do primeiro Processo diz respeito precisamente a isto: Interrogada se sabia que estava na graça de Deus, responde: se não estou nela, que Deus me queira pôr; se aí estou, Deus me queira conservar» (Ibid., p. 62; cf. Catecismo da Igreja Católicaa, n. 2005).

A nossa santa vive a oração na forma de um diálogo contínuo com o Senhor, que ilumina também o seu diálogo com os juízes e lhe dá paz e segurança. Ela pede com confiança: «Dulcíssimo Deus, em honra da vossa santa Paixão, peço-vos, se me amais, que me reveleis como devo responder a estes homens de Igreja» (Ibid., p. 252). Jesus é contemplado por Joana como o «Rei do Céu e da Terra». Assim, no seu estandarte, Joana mandou pintar a imagem de «Nosso Senhor que mantém o mundo» (Ibid., p. 172): ícone da sua missão política. A libertação do seu povo é uma obra de justiça humana, que Joana realiza na caridade, por amor a Jesus. O seu é um bonito exemplo de santidade para os leigos comprometidos na vida política, sobretudo nas situações mais difíceis. A fé é a luz que orienta todas as opções, como testemunhará um século mais tarde outro grande santo, o inglês Tomás More. Em Jesus, Joana contempla também toda a realidade da Igreja, tanto a «Igreja triunfante» do Céu, como a «Igreja militante» da terra. Segundo as suas palavras, «um só é Nosso Senhor e a Igreja» (Ibid., p. 166). Esta afirmação, citada pelo Catecismo da Igreja Católica (cf. n. 795), tem uma índole verdadeiramente heróica no contexto do Processo de Condenação, diante dos seus juízes, homens de Igreja, que a perseguiram e a condenaram. No Amor de Jesus, Joana encontra a força para amar a Igreja até ao fim, inclusive no momento da condenação.

Apraz-me recordar como santa Joana d’Arc teve uma profunda influência sobre uma jovem santa da época moderna: Teresa do Menino Jesus. Numa vida completamente diferente, transcorrida na clausura, a carmelita de Lisieux sentia-se muito próxima de Joana, vivendo no coração da Igreja e participando nos padecimentos de Cristo para a salvação do mundo. A Igreja reuniu-as como Padroeiras da França, depois da Virgem Maria. Santa Teresa tinha expresso o seu desejo de morrer como Joana, pronunciando o Nome de Jesus (Manuscritto B, 3r), e era animada pelo mesmo grande amor a Jesus e ao próximo, vivido na virgindade consagrada.

Queridos irmãos e irmãs, com o seu testemunho luminoso, santa Joana d’Arc convida-nos a uma medida alta da vida cristã: fazer da oração o fio condutor dos nossos dias; ter plena confiança no cumprimento da vontade de Deus, qualquer que ela seja; viver a caridade sem favoritismos, sem limites e, como ela, haurindo do Amor de Jesus um profundo amor pela Igreja. Obrigado!


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Saudação

Saúdo, com afecto a todos vós, amados peregrinos de língua portuguesa, desejando que esta peregrinação a Roma vos encha de luz e fortaleza no vosso testemunho cristão, para confessardes Jesus Cristo como único Salvador e Senhor da vossa vida: fora d'Ele não há vida nem esperança de a ter. Com Cristo, ganha sentido a vida que Deus vos confiou. Para cada um de vós e família, a minha Bênção!

Audiência geral das Quartas - 19 de Janeiro de 2011



Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos

Amados irmãos e irmãs

Celebramos a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, em que todos os crentes em Cristo são convidados a unir-se em oração para dar testemunho do profundo vínculo que existe entre eles e para invocar o dom da plena comunhão. É providencial o facto de que, no caminho para construir a unidade, a oração seja posta no centro: isto recorda-nos, mais uma vez, que a unidade não pode ser um simples produto do agir humano; ela é antes de tudo um dom de Deus, que comporta um crescimento na comunhão com o Pai, o Filho e o Espírito Santo. O Concílio Vaticano II diz: «Tais preces comuns são certamente um meio muito eficaz para impetrar a graça da unidade. São uma genuína manifestação dos vínculos pelos quais os católicos ainda estão unidos aos irmãos separados: “Porque onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome [diz o Senhor], aí estou Eu no meio deles” (Mt 18, 20)» (Decreto Unitatis redintegratio, 8). O caminho rumo à unidade visível entre todos os cristãos habita na oração porque, fundamentalmente, a unidade não somos nós que a «costruímos», mas é Deus que a «constrói», deriva dele, do Mistério trinitário, da unidade do Pai com o Filho no diálogo de amor que é o Espírito Santo, e o nosso compromisso ecuménico deve abrir-se à obra divina, deve fazer-se invocação quotidiana da ajuda de Deus. A Igreja é sua, e não nossa.

O tema escolhido este ano para a Semana de Oração faz referência à experiência da primeira comunidade cristã de Jerusalém, como é descrita pelos Actos dos Apóstolos; ouvimos o texto: «Eles eram assíduos ao ensino dos apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e à oração» (Act 2, 42). Devemos considerar que já no momento do Pentecostes o Espírito Santo desce sobre pessoas de diferentes línguas e culturas: isto significa que a Igreja abraça desde o início pessoas de diversas proveniências e, todavia, precisamente a partir de tais diferenças, o Espírito cria um único corpo. Como início da Igreja, o Pentecostes assinala a ampliação da Aliança de Deus a todas as criaturas, povos e tempos, para que a inteira criação caminhe rumo à sua verdadeira finalidade: ser lugar de unidade e de amor.

No trecho citado pelos Actos dos Apóstolos, quatro características definem a primeira comunidade cristã de Jerusalém como lugar de unidade e de amor, e são Lucas não quer apenas descrever algo do passado. Oferece-nos este modelo como norma da Igreja presente, porque estas quatro características devem constituir sempre a vida da Igreja. Primeira característica, ser unida e assídua à escuta do ensino dos Apóstolos, depois à comunhão fraterna, à fracção do pão e às orações. Como eu disse, estes quatro elementos ainda hoje são os pilares da vida de cada comunidade cristã e constituem também o único fundamento sólido sobre o qual progredir na busca da unidade visível da Igreja.

Antes de tudo temos a escuta do ensino dos Apóstolos, ou seja, a escuta do testemunho que eles dão da missão, da vida, morte e ressurreição do Senhor. É a isto que Paulo chama simplesmente o «Evangelho». Os primeiros cristãos recebiam o Evangelho dos lábios dos Apóstolos, eram unidos pela sua escuta e pela sua proclamação porque o Evangelho, como afirma São Paulo, «é uma força vinda de Deus para a salvação de todo aquele que crê» (Rm 1, 16). Ainda hoje, a comunidade dos fiéis reconhece na referência ao ensino dos Apóstolos a norma da própria fé: cada esforço pela construção da unidade entre todos os cristãos passa, portanto, através do aprofundamento da fidelidade ao depositum fidei que nos foi transmitido pelos Apóstolos. Firmeza na fé é o fundamento da nossa comunhão, é o alicerce da unidade cristã.

O segundo elemento é a comunhão fraterna. Na época da primeira comunidade cristã, bem como nos nossos dias, ela é a expressão mais tangível, sobretudo para o mundo externo, da unidade entre os discípulos do Senhor. Nos Actos dos Apóstolos lemos que os primeiros cristãos tinham tudo em comum, e quem dispunha de propriedades e bens, vendia-os para os dividir com os necessitados (cf. Act 2, 44-45). Na história da Igreja, esta partilha dos próprios bens encontrou modalidades de expressão sempre novas. Uma delas, peculiar, é a das relações de fraternidade e de amizade, construídas entre cristãos de diversas confissões. A história do movimento ecuménico está marcada por dificuldades e incertezas, mas é também uma história de fraternidade, de cooperação e de partilha humana e espiritual, que mudou em medida significativa as relações entre os crentes no Senhor Jesus: todos estamos comprometidos em continuar por este caminho. Portanto o segundo elemento, a comunhão, é antes de tudo comunhão com Deus através da fé; mas a comunhão com Deus cria a comunhão entre nós e manifesta-se necessariamente naquela comunhão concreta da qual falam os Actos dos Apóstolos, ou seja, a partilha. Ninguém na comunidade cristã deve sentir fome, nem ser pobre: esta é uma obrigação fundamental. A comunhão com Deus, realizada como comunhão fraterna, expressa-se concretamente no compromisso social, na caridade cristã e na justiça.

Terceiro elemento: na vida da primeira comunidade de Jerusalém era essencial o momento da fracção do pão, em que o próprio Senhor se torna presente com o único sacrifício da Cruz no seu doar-se completamente pela vida dos seus amigos: «Isto é o meu Corpo que será entregue por vós... Este é o cálice do meu Sangue... derramado por vós». «A Igreja vive da Eucaristia. Esta verdade não exprime apenas uma experiência diária de fé, mas contém em síntese o próprio núcleo do mistério da Igreja» (João Paulo II, Encíclica Ecclesia de Eucharistia, 1). A comunhão no sacrifício de Cristo é o ápice da nossa união com Deus e portanto representa também a plenitude da unidade dos discípulos de Cristo, a plena comunhão. Durante esta semana de oração pela unidade é particularmente viva a lástima pela impossibilidade de compartilhar a mesma Mesa eucarística, sinal de que ainda estamos distantes da realização da unidade pela qual Cristo orou. Esta experiência dolorosa, que confere inclusive uma dimensão penitencial à nossa oração, deve tornar-se motivo de um compromisso ainda mais generoso da parte de todos a fim de que, removidos os obstáculos para a plena comunhão, chegue o dia em que será possível reunir-nos ao redor da Mesa do Senhor, partir juntos o Pão eucarístico e beber do mesmo cálice.

Enfim, a oração — ou, como diz são Lucas, as orações — é a quarta característica da Igreja primitiva de Jerusalém, descrita no livro dos Actos dos Apóstolos. A oração é desde sempre a atitude constante dos discípulos de Cristo, o que acompanha a sua vida diária em obediência à vontade de Deus, como nos atestam também as palavras do apóstolo Paulo, que escreve na primeira carta aos Tessalonicenses: «Vivei sempre felizes. Orai sem cessar. Em todas as circunstâncias dai graças, porque esta é a vontade de Deus para vós em Jesus Cristo» (1 Ts 5, 16-18; cf. Ef 6, 18). A oração cristã, participação na prece de Jesus, é experiência filial por excelência, como nos atestam as palavras do Pai-Nosso, oração da família — o «nós» dos filhos de Deus, dos irmãos e das irmãs — que fala ao Pai comum. Portanto, pôr-se em atitude de oração significa também abrir-se à fraternidade. Só no «nós» podemos recitar o Pai-Nosso. Por isso abramo-nos à fraternidade, que deriva do facto de sermos filhos do único Pai celeste e estarmos dispostos ao perdão e à reconciliação.

Caros Irmãos e Irmãs, como discípulos do Senhor temos uma comum responsabilidade pelo mundo, temos que prestar um serviço comum: como a primeira comunidade cristã de Jerusalém, começando a partir daquilo que já compartilhamos, temos que oferecer um forte testemunho, fundado espiritualmente e sustentado pela razão, do único Deus que se revelou e nos fala em Cristo, para sermos portadores de uma mensagem que oriente e ilumine o caminho do homem do nosso tempo, muitas vezes desprovido de pontos de referência claros e válidos. Então, é importante crescer cada dia no amor recíproco, comprometendo-nos a superar as barreiras que ainda existem entre os cristãos; sentir que existe uma verdadeira unidade interior entre todos aqueles que seguem o Senhor; colaborar o mais possível, trabalhando juntos sobre as questões ainda abertas; e sobretudo permanecendo conscientes de que neste itinerário o Senhor deve assistir-nos, ainda nos deve ajudar muito, pois sem Ele, sozinhos, sem «permanecer nele», nada podemos (cf. Jo 15, 5).

Estimados amigos, é de novo na oração que nos encontramos reunidos — particularmente nesta semana — com todos aqueles que professam a sua fé em Jesus Cristo, Filho de Deus: perseveremos na oração, sejamos homens de oração, implorando de Deus o dom da unidade, para que se realize para o mundo inteiro o seu desígnio de salvação e de reconciliação. Obrigado!


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Saudação

Amados peregrinos de língua portuguesa, sede bem-vindos! A todos saúdo com grande afeto e alegria, exortando-vos a perseverar na oração, pedindo a Deus o dom da unidade, a fim de que se cumpra no mundo inteiro o seu desígnio de salvação! Ide em paz!

Audiência geral das Quartas - 12 de Janeiro de 2011



Santa Catarina de Génova

Prezados irmãos e irmãs!

Hoje gostaria de vos falar de outra santa que tem o nome de Catarina, depois de Catarina de Sena e Catarina de Bolonha; falo de Catarina de Génova, conhecida sobretudo pela sua visão sobre o purgatório. O texto que descreve a sua vida e o seu pensamento foi publicado nessa cidade da Ligúria em 1551; ele é dividido em três parte: a Vida propriamente dita, a Demonstração e declaração do purgatório — mais conhecida como Tratado — e o Diálogo entre a alma e o corpo (cf. Livro da Vida admirável e da doutrina santa, da beata Catarina de Génova, que contém uma útil e católica demonstração e declaração do purgatório, Génova, 1551). O redactor final foi o confessor de Catarina, o sacerdote Cattaneo Marabotto.

Catarina nasceu em Génova, em 1447; última de cinco filhos, ficou órfã do pai, Giacomo Fieschi, ainda em tenra idade. A mãe, Francesca di Negro, dispensou uma válida educação cristã, a tal ponto que a maior das duas filhas se tornou religiosa. Com 16 anos, Catarina foi concedida como esposa a Giuliano Adorno, um homem que, depois de várias experiências comerciais e militares no Médio Oriente, tinha regressado a Génova para casar. A vida matrimonial não foi fácil, também devido à índole do marido, apaixonado pelo jogo de azar. Inicialmente, a própria Catarina foi induzida a levar um tipo de vida mundana em que, contudo, não conseguia encontrar a serenidade. Depois de dez anos, no seu coração havia um profundo sentido de vazio e de amargura.

A conversão teve início a 20 de Março de 1473, graças a uma experiência singular. Tendo ido à igreja de são Bento e ao mosteiro de Nossa Senhora das Graças para se confessar, ajoelhou-se diante do sacerdote e «recebeu — como ela mesma escreve — uma chaga no coração, de um imenso amor de Deus», com uma visão tão clarividente das suas misérias e dos seus defeitos e, ao mesmo tempo, da bondade de Deus, que quase desmaiou. Foi tocada no coração por este conhecimento de si mesma, da vida vazia que ela levava e da bondade de Deus. Desta experiência derivou a decisão que orientou toda a sua vida, expressa com estas palavras: «Basta com o mundo e com os pecados» (cf. Vida admirável, 3rv). Então Catarina fugiu, suspendendo a Confissão. Voltou para casa, entrou no quarto mais escondido e chorou prolongadamente. Naquele momento, foi instruída interiormente sobre a oração e adquiriu a consciência do imenso amor de Deus por ela, pecadora, uma experiência espiritual que não conseguia expressar com palavras (cf. Vida admirável, 4r). Foi nessa ocasião que lhe apareceu Jesus sofredor que carregava a cruz, como é frequentemente representado na iconografia da santa. Poucos dias depois, foi ter com o sacerdote para finalmente realizar uma boa Confissão. Aqui teve início aquela «vida de purificação» que, durante muito tempo, lhe fez sentir uma dor constante pelos pecados cometidos e que a impeliu a impor-se penitências e sacrifícios para demonstrar o seu amor a Deus.

Neste caminho, Catarina foi-se aproximando cada vez mais do Senhor, até entrar naquela que é denominada «vida unitiva», ou seja, uma relação de profunda união com Deus. Na Vida está escrito que a sua alma era orientada e ensinada interiormente só pelo dócil amor de Deus, que lhe concedia tudo aquilo que ela precisava. Catarina abandonou-se de modo tão total nas mãos do Senhor que chegou a viver, durante cerca de vinte e cinco anos — como ela escreve — «sem o intermédio de qualquer criatura, instruída e governada unicamente por Deus» (Vida, 117r-118r), alimentada sobretudo pela oração constante e pela Sagrada Comunhão recebida todos os dias, o que não era comum na sua época. Só muitos anos mais tarde o Senhor lhe concedeu um sacerdote que cuidasse da sua alma.

Catarina hesitava sempre em confiar e manifestar a sua experiência de comunhão mística com Deus, sobretudo pela profunda humildade que sentia diante das graças do Senhor. Foi só a perspectiva de dar glória a Ele e de poder favorecer o caminho espiritual de outros que a levou a narrar aquilo que se verificava nela, a partir do momento da sua conversão, que é a sua experiência originária e fundamental. O lugar da sua ascensão aos vértices místicos foi o hospital de Pammatone, a maior estrutura hospitalar genovesa, da qual foi directora e animadora. Portanto, não obstante esta profundidade da sua vida interior, Catarina vive uma existência totalmente activa. Em Pammatone foi-se formando ao seu redor um grupo de seguidores, discípulos e colaboradores, fascinados pela sua vida de fé e pela sua caridade. O próprio marido, Giuliano Adorno, foi conquistado por ela, a ponto de abandonar a sua vida desregrada, de se tornar terciário franciscano e de se transferir para o hospital, para oferecer a sua ajuda à esposa. O compromisso de Catarina no cuidado dos doentes continuou até ao fim do seu caminho terreno, a 15 de Setembro de 1510. Desde a conversão até à morte, não houve acontecimentos extraordinários, mas dois elementos caracterizaram toda a sua existência: por um lado a experiência mística, ou seja, a profunda união com Deus, sentida como uma união esponsal e, por outro, a assistência aos enfermos, a organização do hospital e o serviço ao próximo, especialmente aos mais necessitados e abandonados. Estes dois pólos — Deus e o próximo — preencheram totalmente a sua vida, transcorrida praticamente entre as paredes do hospital.

Estimados amigos, nunca devemos esquecer que quanto mais amarmos a Deus e formos constantes na oração, tanto mais conseguiresmos amar verdadeiramente quantos estão ao nosso redor, quem está perto de nós, porque seremos capazes de ver em cada pessoa o Rosto do Senhor, que ama sem limites nem distinções. A mística não cria distâncias em relação ao outro, não cria uma vida abstracta, mas sobretudo aproxima do outro, porque se começa a ver e a agir com os olhos, com o Coração de Deus.

O pensamento de Catarina sobre o purgatório, pelo qual ela é particularmente conhecida, está condensado nas últimas duas partes do livro citado no início: o Tratado sobre o purgatório e o Diálogo entre a alma e o corpo. É importante observar que, na sua experiência mística, Catarina jamais tem revelações específicas sobre o purgatório ou sobre as almas que ali estão a purificar-se. Todavia, nos escritos inspirados pela nossa santa, é um elemento central, e o modo de o descrever tem características originais em relação à sua época. O primeiro traço original diz respeito ao «lugar» da purificação das almas. No seu tempo, ele era representado principalmente com o recurso a imagens ligadas ao espço: pensava-se num certo espaço, onde se encontraria o purgatório. Em Catarina, ao contário, o purgatório não é apresentado como um elemento da paisagem das vísceras da terra: é um fogo não exterior, mas interior. Este é o purgatório, um fogo interior. A santa fala do caminho de purificação da alma, rumo à plena comunhão com Deus, a partir da própria experiência de profunda dor pelos pecados cometidos, em relação ao amor infinito de Deus (cf. Vida admirável, 171v). Ouvimos sobre o momento da conversão, quando Catarina sente repentinamente a bondade de Deus, a distância infinita da própria vida desta bondade e um fogo ardente no interior de si mesma. E este é o fogo que purifica, é o fogo interior do purgatório. Também aqui há um traço original em relação ao pensamento do tempo. Com efeito, não se começa a partir do além para narrar os tormentos do purgatório — como era habitual naquela época e talvez ainda hoje — e depois indicar o caminho para a purificação ou a conversão, mas a nossa santa começa a partir da própria experiência interior da sua vida a caminho da eternidade. A alma — diz Catarina — apresenta-se a Deus ainda vinculada aos desejos e à pena que derivam do pecado, e isto torna-lhe impossível regozijar com a visão beatífica de Deus. Catarina afirma que Deus é tão puro e santo que a alma com as manchas do pecado não pode encontrar-se na presença da majestade divina (cf. Vida admirável, 177r). E também nós sentimos como estamos distantes, como estamos repletos de tantas coisas, a ponto de não podermos ver Deus. A alma está consciente do imenso amor e da justiça perfeita de Deus e, por conseguinte, sofre por não ter correspondido de modo correcto e perfeito a tal amor, e precisamente o amor a Deus torna-se chama, é o próprio amor que a purifica das suas escórias de pecado.

Em Catarina entrevê-se a presença de fontes teológicas e místicas das quais era normal haurir na sua época. Em particular, encontra-se uma imagem típica de Dionísio, o Areopagita, ou seja, aquela do fio de ouro que liga o coração humano ao próprio Deus. Quando Deus purifica o homem, liga-o com um fio de ouro extremamente fino, que é o seu mor, e atrai-o a si com um afecto tão forte, que o homem permanece como que «superado, vencido e totalmente fora de si». Assim, o coração do homem é invadido pelo amor de Deus, que se torna o único guia, o único motor da sua existência (cf. Vida admirável, 246rv). Esta situação de elevação a Deus e de abandono à sua vontade, expressa na imagem do fio, é utilizada por Catarina para manifestar a obra da luz divina nas almas do purgatório, luz que as purifica e eleva aos esplendores dos raios fúlgidos de Deus (cf. Vida admirável, 179r).

Queridos amigos, na sua experiência de união com Deus os santos alcançam um «saber» tão profundo dos mistérios divinos, no qual o amor e o conhecimento se compenetram, a ponto de ajudarem os próprios teólogos no seu compromisso de estudo, de intelligentia fidei, de intelligentia dos mistérios da fé, de aprofundamento real dos mistérios, por exemplo daquilo que é o purgatório.

Com a sua vida, santa Catarina ensina-nos que quanto mais amamos a Deus e entramos em intimidade com Ele na oração, tanto mais Ele se faz conhecer e acende o nosso coração com o seu amor. Escrevendo acerca do purgatório, a santa recorda-nos uma verdade fundamental da fé, que se torna para nós um convite a rezar pelos defuntos, a fim de que eles possam chegar à visão beatífica de Deus na comunhão dos santos (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1032). Além disso, o serviço humilde, fiel e generoso, que a santa prestou durante toda a sua vida no hospital de Pammatone, é um exemplo luminoso de caridade para todos e um encorajamento especialmente para as mulheres que oferecem uma contribuição fundamental para a sociedade e a Igreja com a sua obra preciosa, enriquecida pela sua sensibilidade e pela atenção aos mais pobres e necessitados. Obrigado!


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Saudação

Amados peregrinos de língua portuguesa, de quem me apraz salientar a presença do grupo de juristas do Brasil: para todos vai a minha saudação amiga de boas-vindas, com o convite a aderirdes sempre mais a Jesus Cristo e a fazerdes do seu Evangelho o guia do vosso pensamento e da vossa vida. Então sereis, na sociedade, aquele fermento de vida nova que a humanidade precisa para construir um futuro mais justo e solidário, que sonhais e servis com a vossa actividade. Sobre vós e vossas famílias, desça a minha Bênção Apostólica.